Quando eu era criança, costumava dizer que queria ser piloto. Astronauta era parte do meu sonho, mas com um segundo passo. Era algo ainda "sem perspectiva" no Brasil. Negócio de americanos e russos apenas.
Entretanto, ser piloto era algo mais próximo. Eu podia me ver, no futuro, pilotando aqueles aviões do aeroclube da cidade.
Mesmo assim, quando eu falava do meu sonho de ser piloto, o que eu mais ouvia eram piadinhas, conselhos e razões para eu desistir daquela ideia. O apoio veio de casa, dos meus pais, e da escola, dos meus professores. E eles estavam certos. Eu acreditei neles e realizei meu sonho.
Após realizar a Missão Centenário, minha primeira missão espacial, aliás, a primeira da história do Brasil, muitos jovens passaram a acalentar o sonho de também serem astronautas profissionais.
Uma mensagem para os pais e os professores: "Incentivem e acreditem nos seus filhos e alunos!".
Hoje, o cenário é muito diferente daquele que havia quando eu era adolescente, nos anos 70. Hoje existe "perspectiva". Hoje, eles têm boas chances de realmente se tornarem astronautas profissionais.
Mensagem para você, jovem: "Acredite em você! Não deixe que ninguém, especialmente você mesmo, destrua seu sonho!".
Vejamos o cenário atual:
- O caminho já está aberto para essa profissão no Brasil. Eu abri esse caminho quando realizei a Missão Centenário. Como pioneiro, passei por enormes dificuldades antes e depois da missão. Antes, pelo descrédito de muitos; depois, pela ignorância de alguns. Mas vocês não têm que passar pelo que passei. Hoje, vocês podem seguir com confiança pela estrada que eu construí.
- Eu posso realizar uma segunda missão espacial para o país, sem dúvida. Permaneço à disposição do Brasil, como astronauta profissional, para isso. Mas, além disso, também posso coordenar o treinamento do segundo astronauta profissional brasileiro. Tudo, só depende da vontade do governo e da Agência Espacial Brasileira (AEB). E tenha certeza de que, se um dia eu assumir um cargo na administração pública com influência com influência no programa, ser presidente da EAB, por exemplo, com certeza haverá seleção para outros astronautas.
- Recentemente, o governo americano mudou sua política espacial, abrindo perspectivas para empresas privadas fazerem parte do programa no transporte de carga e astronautas profissionais para a Estação Espacial Internacional. Isso dispara uma onda de novas empresas no mundo todo para atuarem nesse ramo. Como resultado, haverá mais vagas para astronautas profissionais atuarem não só nas agências governamentais, mas também no setor privado.
Aliás, hoje em dia, existe muita querendo "se nomear" astronauta, o que gera certas dúvidas em torno do real título da profissão de astronauta. E isso só tende a aumentar nos próximos anos. Assim, para esclarecimento geral, a NASA define os termos astronauta, astronautas profissionais, cosmonautas, astronautas estrangeiros e turistas espaciais segundo os seguintes critérios:
Astronauta: Segundo a legislação americana, astronauta é a denominação dada a uma pessoa que viaja acima de 80 km de altitude.
Astronauta Profissional: Pessoa cuja atividade profissional é a execução de voos espaciais, podendo ser contratado por um governo ou empresa que opere voos espaciais de forma regular. Corresponde aos pilotos e comissários nos voos comerciais das empresas aéreas.
- A serviço de um país: foi treinado como especialista de missão, concluindo com sucesso o curso de formação de astronautas professionais, com duração mínima de dois anos, no Johnson Space Center (NASA) ou na Cidade das Estrelas (Rússia), sendo declarado astronauta de carreira pelos critérios da NASA e passando a constar como astronauta ou cosmonauta na relação que consta no website: www.jsc.nasa.gov/Bios/astrobio_international.html.
- A serviço de uma empresa comercial: contratado para o cargo de astronauta nas operações de uma empresa que opera voos espaciais de forma regular e tem a formação mínima definida por lei (agência reguladora) e normais operacionais.
Cosmonautas: Astronauta Profissional que voa pela Rússia ou em uma espaçonave russa.
Astronauta Estrangeiro: Do ponto de vista do Brasil:
- Pessoa nascida em outro país ou, se nascida no Brasil, possui dupla cidadania no momento do voo.
- Não realiza o voo devido a um vínculo empregatício com o governo brasileiro ou com uma empresa brasileira responsável pela operação de voos espaciais regulares.
- Voa usando a bandeira de outro país no macacão em uma missão governamental ou privada criada, custeada e definida em outro país.
Turista Espacial: Qualquer astronauta que não é qualificado nos critérios de Astronauta Profissional. Corresponde aos passageiros dos voos comerciais das empresas aéreas. O voo de um turista é realizado sob contrato pago com recursos próprios por agenciamento de empresa privada e ele(a) não tem responsabilidade na operação do veículo.
Portanto, considerando que o Brasil ainda não tem nenhuma empresa para transporte regular de astronautas e carga para a ISS, o jovem que deseja qualificar-se como o Segundo Astronauta Profissional Brasileiro, precisará cumprir os seguintes requisitos mínimos:
- Ser brasileiro(a) nato(a).
- Ter formação superior em exatas ou biológicas.
- Ter idade entre 25 e 45 anos.
- Fluência em inglês.
Nota: Não precisa ser militar (a carreira de astronauta é CIVIL). Não precisa ser atleta. Não precisa ser piloto. A carreira é aberta a ambos os sexos.
- Ser selecionado para ser astronauta brasileiro por um processo de seleção público pela Agência Espacial Brasileira (AEB), que inclui exames de conhecimento acadêmico, experiência profissional, saúde, características psicológicas e estabilidade emocional.
- Ser treinado como especialista de missão em um curso completo de formação de astronautas profissionais, com duração mínima de dois anos, no Johnson Space Center (NASA), na Cidade das Estrelas ou na China (um futuro, quem sabe?).
- Concluir o curso com aproveitamento, sendo declarado astronauta de carreira pelos critérios da NASA e, assim, passar a constar como astronauta ou cosmonauta na relação oficial da NASA, que pode ser encontrada no website: www.jsc.nasa.gov/bios.
- Ser escalado pela AEB para uma missão espacial criada, custeada e definida em conteúdos e objetivos pela AEB.
- Durante a missão, ter nacionalidade única do Brasil e vínculo empregatício apenas com o governo brasileiro, não representando ou sendo custeado por empresas privadas.
- Não representar outro país ou empresas privadas durante a missão, levando apenas a bandeira do Brasil no macacão.
- Permanecer em órbita do planeta, trabalhando nas funções típicas de um astronauta profissional especialista em missão (operação, montagem e manutenção de sistemas) e nos outros objetivos definidos pela AEB para aquela missão. Caso seja uma missão suborbital, o veículo deverá ser desenvolvido no Brasil, pelo Programa Espacial Brasileiro.
- Depois da missão, ficar à disposição do Programa Espacial Brasileiro para outros voos e trabalhar no Brasil para a divulgação do programa, a educação e o desenvolvimento de ciência e tecnologia nacionais.
No momento, apesar do atraso nos cronogramas de desenvolvimento dos veículos privados, acredito que, dentro dos próximos cinco anos, teremos pessoas com cidadania brasileira indo ao espaço. Alguns irão como turistas espaciais; outros como astronautas profissionais estrangeiros com dupla cidadania, voando para um empreendimento comercial estrangeiro (já que não temos nenhuma empresa brasileira desenvolvendo espaçonaves nacionais); e talvez até alguns como astronautas profissionais estrangeiros com dupla cidadania, voando para o governo de outro país (como é o caso do americano-peruano Carlos Noriega, que é contratado pela NASA e voa com a bandeira americana).
Nota: A NASA, seja como astronauta, engenheiro, pesquisador ou outros cargos, só contrata pessoas que tenham cidadania americana, ou seja, americanos. Estrangeiros sem cidadania americana podem apenas trabalhar em empresas privadas contratadas pela NASA com Boeing, Lockheed Martin, etc.
Se realmente houver pessoas com cidadania brasileira voando em uma dessas possibilidades nos próximos anos, é provável que algumas delas tentem se autoproclamar "segundo astronauta brasileiro". Sem dúvida, aplaudirei o esforço pessoal necessário para participar em qualquer tipo de voo espacial. Porém, em termos de Programa Espacial Brasileiro, o que interessa de fato, e o que eu reconhecerei como verdadeiro "Segundo Astronauta Profissional Brasileiro", é aquele que cumprir todos os critérios descritos acima, de forma que possa servir ao nosso país, repartindo comigo o trabalho em prol da educação, ciência e tecnologia do Brasil. Espero que essa pessoa seja você, que está lendo este artigo neste momento e sonhando em carregar nossa bandeira verde e amarela ao espaço. Acredite em você e conte comigo!
Astronauta Marcos Pontes
Nascido em Bauru, SP, em 1963, Marcos Pontes atualmente é Astronauta Profissional Especialista de Missão, formado pela NASA e pela Roscosmos, à disposição do Brasil, aguardando a escalação pelo governo para seu segundo voo espacial. É Palestrante Motivacional, Coach Especialista em Desempenho Pessoal e Desenvolvimento Profissional, Mestre em Engenharia de Sistemas, Engenheiro Aeronáutico pelo ITA, Diretor Técnico do Instituto Nacional para o Desenvolvimento Espacial e Aeronáutico, Empresário, Consultor Técnico, Embaixador Mundial do Ensino Profissionalizante, Embaixador das Nações Unidas para o Desenvolvimento Industrial, Presidente da Fundação Astronauta Marcos Pontes e Autor de três livros: “Missão Cumprida. A história completa da primeira missão espacial brasileira”, “É Possível! Como transformar seus sonhos em realidade” e “O Menino do Espaço. A história do Primeiro Astronauta Brasileiro”, todos publicados pela editora Chris McHilliard do Brasil.
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