Muitos professores e pais, talvez a maioria deles, procuram motivar crianças ao estudo através de recompensas ou castigos.
Certamente esse tipo de incentivo, demonstrado por Ivan Pavlov no final do século 19, funciona bem com respostas comportamentais imediatas, como a salivação de cachorros por associação de um estímulo externo antes da alimentação. Nosso cérebro trabalha sempre por associação, o que se relaciona diretamente com aqueles resultados científicos.
Contudo, tentar incentivar uma criança ao estudo apenas recompensando-a com dinheiro, brinquedos ou qualquer outra coisa, não tem os resultados finais esperados. A mesma discussão se aplica à aplicação de castigo quando ela não apresenta resultados esperados. Como a recompensa e o castigo são dois lados da mesma moeda, um lado ligado ao prazer e outro ligado ao medo, por simplificação, tratarei aqui apenas das recompensas.
É claro que essas tentativas são todas bem intencionadas e até podem incentivar algum comportamento temporário. Porém, o que buscamos no caso da motivação ao estudo é algo mais profundo, uma mudança de atitude.
Basicamente, a tentativa de motivação por recompensa é resumida da seguinte forma: você faz isso, e eu te dou aquilo. No nosso caso, você tira uma nota boa e eu te dou alguma coisa de recompensa.
Levado por essa premissa, a criança pode até estudar com afinco, isto é, mudar seu comportamento temporariamente para aquele esperado pelos pais ou professores, mas o seu real incentivo não tem nada a ver com o ganho de conhecimento ou desenvolvimento pessoal pela educação; ela quer simplesmente ganhar uma recompensa. Notou a diferença de perspectiva e objetivos. A associação mental fica incorreta: eu preciso tirar notas boas para ganhar um prêmio (e sentir prazer). Na verdade, a associação correta deveria ser: eu preciso tirar notas boas para ter sucesso na minha vida (e sentir prazer).
Aqui, primeiro precisamos entender a diferença entre motivação externa e interna.
Recompensa associada apenas ao resultado esperado faz parte do primeiro tipo: motivação externa. Esse tipo de motivação não produz mudanças duradouras de comportamento, pois não causa mudança de atitude. Assim que o incentivo for retirado, isto é, depois de alguns ciclos sem recompensa, a criança ficará desmotivada para o estudo novamente, afinal, seu "prêmio" (objetivo) não existe mais. Além disso, esse tipo de motivação torna a criança muito dependente de avaliações externas de seu desempenho, reduzindo sua capacidade de auto-avaliação e geralmente reduzindo sua autoconfiança e autoestima.
Na verdade, a longo prazo, a motivação externa acaba sendo contra-produtiva, com o aumento dos "preços" das recompensas, possíveis desinteresses pelas recompensas e uma grande probabilidade de abandono total da motivação pelo estudo, já que, nesse contexto baseado apenas em recompensas externas, de fato "nada parece ter uma finalidade real" (afirmação que, nesse caso, é verdade). A finalidade real foi esquecida no processo: o desenvolvimento pessoal através da educação.
Assim, nosso foco em incentivar crianças ao estudo precisa ser com essa finalidade, real e duradoura, que só pode ser alcançado através de "motivação interna".
Nesse tipo de motivação, que desenvolve a atitude e tem duração ilimitada na alteração de comportamento, é preciso levar a criança a escolher e reconhecer suas próprias "recompensas" internas, como autoestima, autoconfiança, satisfação pessoal, prazer, sentimento de poder, etc., associadas ao seu desenvolvimento pessoal através do conhecimento e habilidades fornecidos pela educação. Em termos de competência, é preciso que ela desenvolva a correta atitude para compor seu cenário de desenvolvimento.
Em resumo, podemos exemplificar: existe uma carteira cheia de dinheiro no chão, ao lado do seu assento no cinema. Possíveis comportamentos:
1. Você pega a carteira e devolve "apenas" porque alguém está olhando. Isso é como funciona a motivação externa - no caso, medo do castigo, reprovação. Se ninguém estivesse olhando você não devolveria;
2. Você pega a carteira e devolve porque acredita que honestidade é importante. Assim funciona a motivação interna, nesse caso, ganho de autoestima. Você devolveria sempre, mesmo que ninguém estivesse olhando. Percebeu a importância da atitude no incentivo continuado pelo estudo.
A questão é: de onde vem "a atitude"?
Nossa atitude é resultado de uma série de crenças que desenvolvemos a partir da nossa experiência de vida, dos nossos valores e da influência de pessoas que consideramos importantes em nossa vida. As crenças funcionam como uma espécie de filtro, um tipo de óculos "especial" pelo qual enxergamos os fatos da vida.
Desse ponto de vista, nota-se claramente duas coisas:
1. Na parte de experiências pessoais, podemos usar um sistema composto (motivação interna e externa) para maior eficiência no incentivo para o estudo e aprendizado;
2. Com relação aos valores pessoais e à influência de pessoas, existe uma importante participação da família e do círculo de relacionamento no desenvolvimento da criança.
Quanto ao desenvolvimento de experiências pessoais, é necessário propor desafios interessantes, com metas claras e factíveis, para cada idade e estabelecer um sistema de recompensas nesses casos (motivação externa) que ressalte o esforço na busca de soluções e seja associado de alguma forma ao ganho de conhecimento como fator de prazer e aumento de autoestima e autoconfiança da criança a cada nível de dificuldade superado. Além disso, valores ensinados e observados na família, associados a palavras de incentivo, exemplos e histórias inspiradoras são essenciais.
Isso tudo é desafiador também para a criatividade dos pais e professores? Claro que é! Mas o futuro das suas crianças vale a pena, não é?
Astronauta Marcos Pontes
Nascido em Bauru, SP, em 1963, Marcos Pontes atualmente é Astronauta Profissional Especialista de Missão, formado pela NASA e pela Roscosmos, à disposição do Brasil, aguardando a escalação pelo governo para seu segundo voo espacial. É Palestrante Motivacional, Coach Especialista em Desempenho Pessoal e Desenvolvimento Profissional, Mestre em Engenharia de Sistemas, Engenheiro Aeronáutico pelo ITA, Diretor Técnico do Instituto Nacional para o Desenvolvimento Espacial e Aeronáutico, Empresário, Consultor Técnico, Embaixador Mundial do Ensino Profissionalizante, Embaixador das Nações Unidas para o Desenvolvimento Industrial, Presidente da Fundação Astronauta Marcos Pontes e Autor de três livros: “Missão Cumprida. A história completa da primeira missão espacial brasileira”, “É Possível! Como transformar seus sonhos em realidade” e “O Menino do Espaço. A história do Primeiro Astronauta Brasileiro”, todos publicados pela editora Chris McHilliard do Brasil.
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